A procura do azeite ideal ft. Ana Beloto
Extraído do fruto (azeitonas) das oliveiras, o azeite é um óleo versátil e cheio de propriedades benéficas a saúde que há milhares de anos tem uma importância muito grande na culinária.
A procura do azeite ideal ft. Ana Beloto
Inicialmente produzido nos países do mediterrâneo, hoje várias regiões se dedicam na especialização da produção deste produto tão valorizado e bastante consumido no mundo inteiro. O país líder na produção de azeites é a Espanha seguido de outros países banhados pelo mar mediterrâneo. Nos Estados Unidos, a Califórnia se destaca como estado líder produtor.
No Brasil, as tentativas iniciais de se trazer mudas e iniciar o cultivo das oliveiras foram barradas pela Coroa, visando proteger os importadores portugueses. Com isso, até pouco tempo, o consumo expressivo de azeite no país se dava através de produtos importados da Europa, principalmente, Portugal. Mesmo assim, atualmente, o país vem se destacando na produção e colecionando prêmios em competições internacionais. Nos últimos anos, algumas marcas foram citadas no guia italiano Flos olei, com os 500 melhores do mundo. Também, no ínicio de 2019, o Brasil conquistou 22 medalhas na competição NYIOOC (World Olive Oil Competition), em Nova Iorque.
Os principais tipos
O conhecimento sobre o universo do azeite é vasto e para se iniciar um entendimento é preciso observar algumas características importantes que diferenciam um produto de boa qualidade. Algumas delas são: os tipos de azeitonas utilizadas; a localização e condições onde as oliveiras são plantadas (terroir); método da colheita; método de prensagem ou extração.
I. Azeites extra-virgem e virgem
São os azeites extraídos da primeira prensagem das azeitonas. Consegue se extrair até 90% do suco da fruta sem a utilização de processos de aquecimento e compostos químicos. O que diferencia os dois tipos é o nível de ácidos oleicos. O azeite extra-virgem (EVOO) é o de melhor qualidade e de acordo com a organização regulamentadora (IOOC), o nível de acidez não pode ser maior que 0,8%. Geralmente, apresenta uma cor dourada e ao mesmo tempo esverdeada e seu gosto é bem intenso e elaborado, com uma leve picância. O azeite virgem mantém características de pureza e gosto das azeitonas, mas com uma tolerância maior a acidez, não passando de 1,5%.
II. Azeites refinados
Utilizam de compostos químicos e temperaturas altas no processo de extração. Desse modo, há uma perda grande de sabores, coloração, nutrientes e vitaminas. Normalmente são misturados com azeites virgem e extra-virgem para a comercialização.
III. Azeites Orgânicos
Como qualquer planta, as oliveiras também sofrem com vários tipos de pestes nas plantações. Além de não utilizar pesticidas e fungicidas os produtores de azeites orgânicos trabalham na correção do solo através de adubos naturais. Em termos de propriedades, os azeites orgânicos são muito parecidos com os de tipo virgem.
Dicas na hora da compra
A primeira coisa que deve ser observada na hora de comprar um azeite vigem ou extra-virgem de qualidade, é a data da colheita. A data recente é uma indicação de frescor pois o azeite começa a perder suas propriedades, em média, dezoito meses após a colheita.
Outro aspecto importante é a garrafa e o local que se acondiciona o azeite. Deve se optar pelas garrafas de vidro escuro que mantém as propriedades e evitam a oxidação. Também, deve-se tomar cuidado para não esquecer o vidro em locais quentes, como perto do forno.
Nos últimos tempos, a indústria mundial de azeite vem sofrendo com as fraudes. Muitos produtos estão vindo com informações que não são verdadeiras e dão a impressão de sofisticação. Faça o balanço do preço que você está pagando e os atributos do azeite. Desconfie de preços muito baixos e atributos muito relevantes. Uma dica é conhecer melhor os produtos locais que estão trabalhando para construir suas marcas. Geralmente, estes produtos contêm informações mais detalhadas do que está sendo comercializado.
Cozinhar com azeite é saudável
Existem alguns mitos de que os azeites não devem ser utilizados para cozinhar em altas temperaturas, sendo aplicáveis somente para temperar e na preparação de comidas frias. Isso se mostra falso através de vários estudos. É comprovado que a estrutura química dos azeites, são resistentes as altas temperaturas de cozimento, até mais resistentes que os outros óleos comuns (soja, milho, canola). Ainda, por apresentar maiores quantidades de gorduras monossaturadas e antioxidantes, os azeites virgem/extra-virgem são recomendados para uma dieta saudável.
Para evitar a gordura trans é importante cozinhar com a temperatura abaixo do momento oxidante. As faixas do ponto de queima dos azeites geralmente variam de 190 a 238°C.
Características e harmonizações na hora de cozinhar
O aroma e sabor do azeite são definidos pela variação e maturação do fruto. O azeite terá mais características de intensidade, amargor e picância quando o fruto (azeitona) for mais verde. Com o fruto mais maduro, as características do azeite serão mais delicadas, suaves e doces. Os azeites com características mais complexas e intensas vão bem com os alimentos mais amargos. Já os de frutos mais maduros combinam mais com os alimentos curados e, também, peixes.
Uma tendência nos dias de hoje é o azeite aromatizado, feito através do método de infusão. O processo é feito a partir de especiarias e ervas moídas, que ficam mergulhadas dentro do azeite por um determinado período. Após este período, o azeite é filtrado para remover as impurezas. É importante seguir de forma precisa as especificações para realizar a infusão. Caso contrário, o azeite pode perder algumas propriedades químicas.
Entrevista com a azeitóloga, Ana Beloto:
Apaixonada pela cultura dos azeites de oliva, a azeitóloga Ana Beloto é comunicóloga, se especializou em marketing, varejo internacional e antropologia da alimentação. Lançou 6 marcas de azeites importados e nacionais no Brasil desde 2002. Se especializou como sommelière de azeites na renomada IFAPA e pela DCOOP, ambas na Andaluzia, na Espanha, e na Universidade Federal de Química do Uruguai. Ao longo dos 16 anos de atuação nesse setor, ela coleciona 18 prêmios nacionais e internacionais promovendo a cultura do azeite de oliva no Brasil e foi condecorada pelo Governo de Minas Gerais com o Prêmio Eduardo Frieiro promovendo os azeites mineiros com o projeto Azeite-se.
Deli&Co.: Para se produzir um bom azeite são necessários vários fatores como: condições de plantio e clima, produtos (frutos), métodos de produção. Qual o maior desafio para a produção nacional de azeites?
Ana Beloto: A oliveira é uma arvore adaptada ao clima mediterrâneo, com pouca umidade e temperaturas muito bem marcadas no inverno e no verão.
O clima tropical brasileiro com chuvas e umidade excessiva no verão, tempo em que ocorre a colheita e a extração do azeite no nosso país é um dos grandes desafios na olivicultura. Outro fator é a adaptação das variedades de azeitonas ao nosso solo rico em nutrientes e ao nosso terreno montanhoso. Isso dificulta a colheita dos frutos por máquinas e a torna mais onerosa e mais demorada por ter que ser feita manualmente.
Deli&Co.: Qual o melhor caminho para tornar o azeite brasileiro de boa qualidade, acessível?
Ana Beloto: Nossa produção é recente já que uma oliveira precisa de no mínimo 10 anos para começar a produzir e ainda aquém da demanda (o Brasil é um dos principais consumidores de azeite de oliva mundial). Precisamos de no mínimo 10 kg de azeitona para produzir 1 litro de azeite e nossas oliveiras, por serem novas, produzem em média 4 a 5 kg no momento. Além disso, pelo nosso relevo montanhoso toda a colheita é feita manualmente, o que encarece também a produção do azeite. Em alguns anos, com o aumento da produção de frutos por oliveira, esperamos ter azeites brasileiros de boa qualidade, como encontramos atualmente, com preços mais acessíveis.
Deli&Co.: Considerando suas pesquisas e o que você tem visto ao longo de muitos anos acompanhado a produção de azeites no Brasil, quais regiões do Brasil têm se destacado na produção de azeites?
Ana Beloto: No Brasil, em função do clima, a produção está concentrada na região sul do país e na região da Serra da Mantiqueira, que abrange os estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.
A produção de azeite no Brasil se iniciou recentemente. Em Maria da Fé, na EPAMIG, foi extraído o primeiro azeite nacional em 2008. Somos o novo mundo dos azeites de oliva. Em 2019 produzimos no Brasil 230 mil litros de azeite de oliva, 40% disso em MG e o restante no sul do pais. São mais de 200 olivicultores cadastrados e muitos de agricultura familiar.
Nossos azeites já são reconhecidos internacionalmente e premiados em concursos renomados na Itália, França, nova York pela sua qualidade e por seus distintos e complexos sabores e aromas. Os azeites mineiros têm como característica sensoriais tropicais, como banana, goiaba, cacau, além de ervas frescas, flores e mel. Essa diversidade, complexidade somada a personalidade intensa de sabores o faz ser bem pontuado em concursos internacionais.
Deli&Co.: Quais as dicas para quem está procurando harmonizar um prato com o azeite mais adequado?
Ana Beloto: O azeite é um alimento versátil. Pode ser usado em receitas doces e salgadas. Em saladas de frutas, com sorvetes e substituindo outras gorduras em receitas como de tortas e bolos. Alimentos marcados pelo sal (curados), por aromas fortes (peixes e queijos) e especiarias devem ser preparados e finalizados com azeite frutado maduro, com notas de amêndoas e aroma e gosto similares aos da azeitona madura. Os alimentos amargos devem ser equilibrados com azeites verdes, jovens, frescos e frutados, normalmente picantes e com certo amargor. Doces (massas, crustáceos e sobremesas) e gordurosos (queijos e carnes) pedem azeite com notas doces, maduro (amendoado) e mais suave. Além de ser uma gordura mais saudável e aguentar altas temperaturas (até 238C) sem perder suas propriedades, é um mito que não podemos aquecer e fritar os alimentos com azeite de oliva.
Deli&Co.: Na hora de degustar um azeite, quais as características você busca para identificar um bom produto? Azeites feitos a partir de azeitonas colhidas jovens (verdes) são melhores?
Ana Beloto: Ao se degustar um azeite temos que nos atentar ao seu aroma, sabores e retrogostos. Um bom azeite deve ter sabores que remetam a frutas, sejam elas verdes ou maduras. Deve conter picância, amargor e quanto mais fresco, melhor! O azeite é um suco de azeitona e como qualquer suco, devemos consumi-lo fresco para aproveitar ao máximo os aromas e sabores.
Azeites feitos com azeitonas mais verdes, no início da safra serão mais clorofilados, terão mais antioxidantes, porem temos também excelentes azeites produzidos com azeitonas maduras, mais no final da colheita. A cor não é um fator determinante de qualidade do azeite e sim do índice de maturação da azeitona do qual ele foi feito. Para a escolha de um bom azeite atente-se a data de validade (quanto mais fresco, melhor), origem e procedência do produto, embalagem de conservação que isole o produto da luz e do oxigênio e que ele esteja armazenado longe do calor.
Deli&Co.: Você acha que o “terroir” brasileiro pode produzir um azeite de características únicas?
Ana Beloto: Com certeza! Nossos azeites já são reconhecidos internacionalmente. A Grappolo 541, por exemplo, é uma variedade que foi extinta na toscana e por semente conseguiram reproduzi-la. Para mim, essa variedade é uma das mais emblemáticas da Mantiqueira. É um azeite bem intenso, seus aromas são herbáceos, de grama recém cortada, folhas de tomate e ervas frescas. Além disso possui sabores intensos de banana, tomate e marca verde, amargos e picantes (atributos positivos de um azeite de oliva) que evoluem na boca. Um azeite que preenche a boca de sabores por um bom tempo. Um churrasco e carnes assadas finalizadas com essa variedade de azeite fica delicioso!